Não corra. Pode doer.

Nós temos um grande potencial dentro de cada um de nós, e muitas vezes escolhemos o curso superior tentando atingir o máximo que somos capazes, e também provar que somos. Experimentamos novas áreas, aprendemos coisas novas, nos dispomos como voluntários, pesquisamos, desenvolvemos e analisamos coisas.

É engraçado perceber que tudo isso acontece naquele minúsculo espaço, entre nós e o computador. Nós lemos, tentamos, assistimos aulas, perguntamos e, acima de tudo, nos esforçamos. Até conseguirmos. Quantas vezes não repetimos esse ciclo num único dia?

Durante a jornada da graduação, enfrentamos problemas, e começamos a buscar liberdades e alívios. Problemas financeiros, com a família, com amigos, de saúde, entre tantos outros. Alguns veem no estudo e no trabalho uma fuga, já que essa realidade não é confrontada no ambiente profissional ou universitário. Urge a necessidade de se formar, como primeiro passo pra libertação.

Mas para se formar bem, é preciso experiência, afinal, que empresa legal e que pode pagar um salário bacana iria contratar um recém-formado com currículo em branco? Ainda nos primeiros períodos do curso, surge a necessidade de preencher o currículo com monitorias, pesquisas, projetos e estágios. Mesmo que, a princípio, sejam voluntários. Tudo isso sem baixar as notas.

A cada dia que passa, enxergamos o quanto é difícil. Aos poucos se vai abdicando pequenas coisas: assistir um filme com a família, fazer as refeições no mesmo horário, encontrar com os amigos, conversar com eles sobre coisas além da universidade. Seus hobbies se transformam em estudos, já que você ainda não conseguiu o tão sonhado estágio que vai garantir algumas portas abertas depois. A cada mês ou semestre, novas coisas começam a deixadas de lado: dormir bem, praticar exercícios ou esportes, a relação com seus amigos, e até um relacionamento.

É claro que nessa jornada você conseguiu muita coisa, afinal, nenhum esforço grande assim passa despercebido pelo mundo, principalmente quando você quer ser notado. Você consegue oportunidades em estágios, projetos ou pesquisas, e é exemplar em cada um deles. Então, começa a se questionar porquê não é notado por aqueles que você queria. E aposta mais coisas nessa busca.

Não é mais um problema trabalhar e estudar à noite, nos finais de semana e feriados. É o que precisa ser feito. A carga é grande demais pra não fazê-lo. E, diminuindo a carga, você sabe que não chegará onde quer.

Cada vez é um fator a mais, um estresse a mais, que surge de uma oportunidade boa demais pra negar. E aceitamos a vida assim. Por um ou dois anos, vai valer a pena esse sacrifício. É um investimento no futuro.

As decepções começam a aparecer, suas expectativas de ser notado continuam não se cumprindo a cada dia, e essa carga de trabalho tão pesada se transforma no seu dia. Você acorda e dorme para cumprir o que acha que os outros esperam de você, adiando a esperança de que vai dar certo. Cada vez mais você acumula rejeições nos estágios dos sonhos. Não desiste de lutar. E meses se passam.

Até que você quebra.

Você está cansado. Olha para o lado e seus amigos, que antes se divertiam tanto juntos, não estão diariamente ao seu lado. Não estão ao seu lado há algum tempo, e você sequer tinha notado. Você não está satisfeito com seu corpo, sua aparência. Pensa em fazer outra coisa pra desestressar, mas o que fazer? Você deixou seus hobbies pra trás há muito tempo.

Estar no computador começa a causar dor, e aos poucos você começa a abdicar de algumas das obrigações. Mesmo sem ter alcançado nada do que imaginava ser possível. Sair de um projeto, não se inscrever em mais uma monitoria. Surge o medo de se formar e estar desempregado, seu pior pesadelo.

Mas existe a possibilidade de continuar na universidade, numa pós graduação, e extender esse tempo de se decidir. Com suas notas e seus esforços, deve ser possível. Mas foi pra isso que você lutou tanto? Pra continuar no mesmo lugar que você está? Sabendo que uma vez ouviu que "a pós-graduação é onde ficam aqueles que não conseguem um emprego"?

Você sabe que isso não é verdade. Mas você correu demais. Esqueceu de aproveitar a graduação. Viver o dia a dia de um projeto, de uma monitoria. Divertir-se com seus amigos, ao invés de tentar agarrar o mundo com seus braços. Esqueceu de cursar uma disciplina e conversar com o professor após a aula, sobre como aquele conteúdo se aplica num problema, mesmo que você não fosse fazê-lo. Sua curiosidade e seu interesse sumiram, pois não havia mais tempo para novas coisas.

Aos poucos, você foi murchando. E, só agora, percebeu que estava murcho.

Não é possível voltar no tempo e reparar tudo, você sabe muito bem. Mas sempre é possível reconsiderar o que está fazendo agora, ponderar melhor e entender suas prioridades. Saúde, tempo, amigos, rir, sorrir, brincar. Assistir um filme ruim só pra dizer que é ruim mesmo, e então rir com seus amigos por vocês terem escolhido passar por isso. Se reaproximar daqueles que importam, das coisas que te faziam sorrir.

A relação com o seu trabalho e seus estudos precisa ser saudável pra dar certo, afinal, você escolheu tudo isso por gostar. Mas sua vida não se resume a um emprego, um título, um trabalho. Escolher esse caminho pode te isolar. Pode doer.

Pare, pense, reflita.
Sempre.
Para só então saber como continuar.

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